domingo, 27 de agosto de 2017

O conformismo pungente de Gómez Dávila

            Nicolás Gómez Dávila, em magnífico ensaio (Textos. Girona: Atalanta, 2010), descreve qual seria a ideia que permeia a alma dum revolucionário e compara-a à do artesão do dia-a-dia, do homem que cumpre seus deveres ciente de quais são suas limitações, de que la condición del hombre es el fracasso.
            Enquanto o espírito irrequieto age como se sua natureza fosse angélica e, por um acaso ocasional das coisas, tem de viver neste mundo alquebrado, sujo e roto; o homem comum, o reacionário, vive sabendo que ele é o que é, suas circunstâncias concretas, e que la consciência es estructuración de la impotência y del fracasso.
            A vida do revolucionário, e aqui sou eu quem o chama assim, consiste num negar-se a si mesmo como homem concreto ou num negar o mundo em que se encontra inserido. É a negação da realidade, portanto. Ou, em palavras diferentes, sua vida é um negar suas próprias circunstâncias para apegar-se à ideia por ele mesmo criada. Inclusive há a negação não só do real, do concreto, mas do próprio tempo, da linha temporal que percorre o ontem, o hoje e percorrerá o amanhã. Daí a ruptura tão comum em sua mente consistente em sempre colocar o imaginado mundo novo (ou homem novo) como objetivo a ser alcançado, independentemente do que é o mundo real, a despeito do que é factível, sobrepondo o futuro imaginado ao presente concreto. E mesmo desconsiderando o preço que pagará por isso. E tal preço é a destruição do real. Seja metaforicamente, como o fazem os filósofos contemporâneos, seja a destruição mesma, crua, mortífera, como o fizeram os políticos da Revolução Francesa e da Revolução Russa, por exemplo.
            Enquanto isso, a vida do reacionário é o contentar-se. Ciente de que o mundo é o mundo e que ele próprio não é uma ideia, mas as circunstâncias com as quais têm de trabalhar, lavora incessantemente, com um sorriso irônico nos lábios, sabendo que de nada valerá seu suor, senão num outro mundo que não é este, pois este não será transmudado em sua essência jamais, quer queira ou não, quer lute por isso ou não.
            Da comparação entre os dois perfis, entre o revolucionário e o reacionário, do que cada um quer e como cada qual age, eis a conclusão – que não poderia trazer senão nas palavras extraídas da prosa lindíssima de Gómez Dávila:

A los hombres que destruyen impelidos por el ciego afán de crear, otros hombres oponen la compasión y el desprecio de un pesimismo viril. Éstos son los hombres cuya conciencia acepta su condición humana, y que acatan, orgullosos y duros, las innaturales exigencias de la vida. Estos hombres compreenden que la enfermedad de la condición humana es la condición humana misma, y que por lo tanto sólo pueden anhelar la mayor perfección compatible con la viciada esencia del universo. Una inquieta ironia conduce sus pasos cautelosos a través de la torpe y áspera insuficiência del mundo.
Como nada esperan de la indiferencia de las cosas, la más leve delicia conmueve su corazón agradecido. Como no confían en la espontánea y blanda bondad del universo, la fragilidad de lo belllo, la endeble de lo grande, la fugacidade atroz de todo esplendor terrestre, despiertan em sus almas el respeto más atento, la reverencia más solemne.
Toda la astucia de sua inteligência, toda la austera agudeza de sua espíritu, apenas bastan para ensayar de proteger y de salvar las semillas esparcidas.