sábado, 23 de fevereiro de 2013
Dostoievski, Dworkin e a modernidade
Ficou célebre a frase que Sartre atribuiu a
Dostoievski segundo a qual: se Deus não
existe, tudo é permitido.
Se as palavras realmente não são bem essas,
Sartre sintetizou nelas todo o pensamento da personagem Ivan Karamazov, que
atribuía à crença na imortalidade que o homem carrega em seu âmago como a origem
da ordem moral que se sustenta na regra de que se há de amar o próximo como a
si mesmo. E, se se perdesse a crença na imortalidade, justamente ao que
aspirava Ivan Karamazov, num prelúdio do que diria aquele alemãozinho maluquético,
tudo seria permitido, até mesmo o
canibalismo.
Dostoievski coloca, pela
boca de sua personagem, algumas questões das mais fundamentais: De onde surgem
os valores que os homens portam? Por que pregamos a obrigação de amar o
próximo? Esses valores são aplicados em qualquer tempo e lugar ou estão à mercê
da aceitação de determinada sociedade? Enfim: tais valores são objetivos ou
dependem de alguma avaliação subjetiva?
Deixarei de lado aqui as discussões entre
os filósofos, e são muitas as altercações, para me ater ao último livro de
Dworkin; obra em que ele sustenta a objetividade dos valores, sem, entretanto,
afirmar por que razão seriam objetivos.
Eis aí o fruto da modernidade na qual as
pessoas perderam a sensação de ser observadas constante e fixamente por um observador onisciente.
Dworkin sabe que, sem a crença em valores
objetivos, a humanidade caminhará a esmo, pois tudo seria permitido, da
antropofagia ao assassinato de crianças ianomâmis e de pequeninas bebês
chinesas. Mas por que Dworkin não dá um passo mais largo e admite, como o fez
Ivan Karamazov, que só existem valores objetivos para aqueles que admitem a
existência dum Deus onisciente? Qual é a dificuldade em assumir isso?
Eu sei qual é a dificuldade, e ela é muito
clara para qualquer um que faça parte do debate público dos tempos atuais. Tudo
tem de ser argumentado sem que Deus exista, pois Deus não pode ser premissa
argumentativa daqueles que se denominam filósofos. Só que, sem Deus, sem partir
do pressuposto de que há um observador onisciente, não se consegue explicar,
por exemplo, por que os valores são objetivos, por que é errado uma criança
ianomâmi ser assassinada pela sua mãe, ainda que isso seja feito em reverência
ao costume da tribo em que elas, mãe e filha, estejam inseridas.
A modernidade, em minha opinião, não se
caracteriza pela tecnologia e pelas ciências que muito se desenvolveram; mas
pela derrota do homem, que finge não crer na presença de Deus onisciente
para, ao fim e ao cabo, acabar confessando seus pecados a um psicanalista,
que nem em pecados acredita!
terça-feira, 12 de fevereiro de 2013
Quem quer modernizar a Igreja?
Com a renúncia de Bento XVI, inicia-se novamente a cantilena
sobre quem haveria de comandar a Igreja para modernizá-la. Quem seria capaz de
tirar a Igreja das trevas medievais em que viveria e conduzi-la à luz? A quem
incumbiria a missão de aproximá-la, de fazer com que essa Igreja de dois mil
anos finalmente se encontre com o mundo moderno?
A pergunta que se deve fazer, no entanto, é outra. Bem
diferente. Ei-la: Quem quer modernizar a Igreja?
São sempre as mesmas pessoas que querem modernizar a Igreja,
aproximando-a do mundo, mundanizando-a.
São as que estão fora dela. De fato, nenhum católico pretende ver
alterados os fundamentos de sua fé, aqueles mesmos construídos sobre o pescador
Simão, a quem Jesus disse: Tu és Pedro, e
sobre esta pedra construirei a minha Igreja (Mt. 16:18). E prova maior de
que os católicos não querem uma Igreja voltada para o mundo foi a eleição de
Bento XVI, num dos conclaves mais céleres da história.
A Igreja Católica, edificada por Jesus sobre os ombros de
Pedro, tem a convicção de que porta a
verdade sobre a revelação divina, encarnada que foi no próprio Cristo, em razão
da Tradição herdada diretamente dos apóstolos, de modo que sua missão é levar o
evangelho a todos, para a salvação de muitos.
E é claro que a revelação divina não agrada ao mundo, não
agrada aos que aceitam o divórcio, aos que abortam ou toleram o infanticídio,
aos que querem assemelhar o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo ao
casamento, não agrada aos que protegem ovos de tartaruga mas permitem a
destruição de seres humanos embrionários em nome da ciência.
São essas pessoas que querem achegar a Igreja ao mundo, para
que vejam, ao fim e ao cabo, a fumaça de Satanás ofuscar o altar em que Cristo é sacrificado.
O que resta, quando se escutam pessoas assim, é saber que a
Igreja está no caminho certo quando dá as costas ao mundo moderno (como nas
missas em que o padre se põe de costas para o povo, voltando sua face
exclusivamente para Deus); mesmo porque o mundo haveria de tomar a Igreja como
luzeiro, e não o contrário.
sábado, 9 de fevereiro de 2013
Não vale viver
Sabe-se o que é amar,
só não se sabe o que é
o objeto amado,
são muitos encontros
e desencontros,
até que se chega a pensar
no desespero de viver
sem o que ama,
sem pelo que sofre,
sem pelo que suspira,
sem pelo que sonha.
Não são necessárias palavras,
basta um só suspiro,
basta um só querer,
basta um só pedido,
para se ter todo um alguém,
todo um ser,
toda uma pessoa
inteiramente sua,
em suas mãos.
Às vezes tudo se embaralha
na convivência e na conveniência
da vida vivida diariamente,
e o amante esquece o que é sofrer,
olvida o sofrer pelo amor ausente.
Esquece o que é amar,
o beijo doce de uma hora,
o beijo querido por horas,
o beijo apaixonado por
que se altera uma vida,
todas as vidas pelas quais
foram vividas horas e horas
de esperança, de sonhos, de desejos.
Apagou-se tudo, apagou-se o querer,
olvidou-se o amor,
esqueceu-se o afeto,
nutrido por sonhos,
por sonhos sonhados
e desejados,
sem os quais
não vale a vida viver.
Assinar:
Postagens (Atom)